Sunday, April 03, 2011

FUTUROS POSSÍVEIS*


Observando o presente, é fácil constatarmos o regresso de um certo quadro de referências que caracterizou a década de 1970. Na recente manifestação de dia 12 de Março, que juntou cerca de 200 mil pessoas só em Lisboa, foi possível ver cartazes recuperando o grito lançado pelo movimento Punk nos anos 1970: No future!

Se por “futuro” entendermos uma ideia, que resulte de um largo consenso, capaz de clarificar e dar sentido ao presente de uma sociedade, então parece inevitável, por dramático que isso seja, admitirmos esta actual ausência de futuro, o que torna urgente que nos mobilizemos num novo projecto: a construção social do futuro. O design joga aqui um papel determinante.

Desde 2001, data da realização do I Fórum Social Mundial que nos fomos familiarizando com o slogan “Um outro mundo é possível”. Este e outros fora, organizados ao longo da última década associavam-se a iniciativas de cidadania, tornadas mais consequentes e mobilizadoras pelas possibilidades de comunicação oferecidas pelas redes sociais, criando um importante movimento não apenas de resistência mas igualmente de resiliência ao modelo de organização social e político (categorias subsumidas, nos últimos tempos, pelo económico) dominante. O design foi marcando presença em muitos desses fora. Na cimeira de Davos, em 2009, por exemplo, o programa do Fórum Económico Mundial reservou espaço para uma mesa de trabalho coordenada por Alice Rawsthorn, sobre o contributo do design para a construção de uma nova ordem mundial.

Observando a crescente responsabilização social que tem orientado os discursos e as práticas do design, devemos reconhecer uma mobilização desta disciplina para se afirmar como uma prática crítica, impondo um olhar, que saindo para fora das paredes dos ateliês de design, se confronta intencionalmente com a realidade, considerando-a enquanto “campo de possibilidades” e procurando projectar alternativas que, de forma positiva e sustentável, permitam ultrapassar determinados problemas presentes. Tomás Maldonado defendia, nos anos 1970, a importância de acreditarmos na “esperança projectual”: projectar significa propor, de forma metódica, alternativas susceptíveis de superar o que é criticável no presente. O desconforto, o inconformismo ou a indignação perante o que existe á nossa volta deve suscitar nos designers o impulso para projectar a sua superação.

Falar em design, deve pressupor falar numa prática profissional colectivamente enquadrada e, ainda, identificar uma agenda social que esclareça acerca das intenções e dos processos que orientam o contributo do design na construção social do futuro. O debate em torno desta agenda, a consciência do seu carácter fulcral, está ainda no início. Tal debate deve, nos próximos tempos, envolver designers, associações de design, escolas, instituições e empresas, sem esquecer os cidadãos – razão de ser te todo o projecto – para, no rumo por ele gerado, encontrarmos um sentido que nos permita afirmar um design que em vez de esgotar a sua energia em experiências diversas de inovação difusa se revele capaz de propor ideias novas sobre a sociedade, a economia, o bem-estar, se revele, enfim, capaz de projectar, neste presente, futuros possíveis.


* Este texto foi publicado no nº 1 do suplemento D com o qual irei colaborar, produzido pela Experimentadesign, integrado na revista Fora de Série do Diário Ecónómico de dia 01 de Abril.

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REACTOR é um blogue sobre cultura do design de José Bártolo (CV). Facebook. e-mail: reactor.blog@gmail.com