Friday, November 30, 2007





Um dos mais importantes ciclos de conferências sobre Design Gráfico do mundo, o Personal Views, regressa a 25 de Janeiro para mais uma - anunciada como última - temporada. O Cartaz - de Ian Anderson a Irma Boom passando pela apetecível dupla, já entrevistada pelo Reactor, William Drentell & Jessica Helfand - é como sempre prometedor e estimulante. Naturalmente o Reactor vai estar presente nas nove sessões que prometem dar pretextos para uma fértil reflexão sobre os discursos e a prática do design.

Thursday, November 29, 2007




JOÃO ABEL MANTA



João Abel Manta nasceu em Lisboa em 1928. Licenciado em Arquitectura pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa em 1951, desenvolveu uma intensa actividade como arquitecto, pintor, ilustrador e designer gráfico.

João Abel Manta é um dos protagonistas da segunda geração do design gráfico português (que sucede à geração de Maria Keil, Paulo Ferreira e Bernardo Marques) onde se destacam nomes como Victor Palla, Manuel Rodrigues, Fred Kradolfer (notável designer suíço “naturalizado”) e Sebastião Rodrigues.





A sua obra gráfica, que começa a ser publicada nos anos 40, revela a profunda cultura artística que João Abel foi beber ao seu pai, às viagens pela Europa, às passagens por Paris e ao confronto com o design gráfico moderno, mas ao mesmo tempo apresenta uma linguagem inovadora, politicamente empenhada, fortemente iconográfica e original.





Se, da sua obra gráfica, se conhecem particularmente as ilustrações, publicadas n’ “O Jornal” e no “Jornal de Letras”, que marcam o período do 25 de Abril (sendo, com Vespeira, o “cartoonista da revolução”) menos conhecida mas igualmente notável é a restante obra gráfica - cartazes, logótipos, capas de livros, e inúmeras composições gráficas para artes aplicadas, azulejos, tapeçaria e calçada portuguesa – que fazem de Manta uma figura destacada da cultura gráfica ibérica da segunda metade do século XX.

Tuesday, November 27, 2007



O MERCADO ANTI-MERCADO

Estou cada vez mais convencido que há actualmente um novo mercado cultural que produz, promove e comercializa “mercadorias” que têm como identidade distintiva assumirem-se como portadoras de uma mensagem anti-capitalista.

Sinal dos tempos e da “democracia” neo-liberal e politicamente correcta que nos domina: o mercado capitalista capitaliza com a crítica do capitalismo. Se em termos europeus este Mercado começa agora a nascer (o "caso" Toscani é diferente), já há algum tempo que nós consumidores europeus – consumidores críticos e socialmente empenhados, sem dúvida – compramos os produtos norte-americanos que este mercado-globalizado-anti-mercado-globalizado nos fornece.

Sob o risco de pôr protagonistas diferentes dentro de um saco comum, vou encontrando cada vez mais semelhanças em autores como Naomi Klein e Kalle Lasn mas também Michael Moore, Morgan Spurlock, Al Gore e uma série de outros autores que parecem recuperar os clichés dos filmes-catástrofe dos anos 70 sob a roupagem de uma mensagem social ou culturalmente empenhada.

Recordo-me que, em 1999, quando ocorreram as grandes manifestações anti-globalização, nomeadamente as que tiveram lugar nas ruas de Seattle mas, igualmente, em Washington, Melbourne, Buenos Aires, Génova e Londres, fiquei surpreendido com o facto dos manifestantes anti-globalização procurarem fazer coincidir as manifestações mais activas com os directos televisivos. Aqueles que se manifestavam contra a globalização cediam ao sistema globalizador, nomeadamente ao poder televisivo, para que a sua mensagem tivesse protagonismo mediático, mesmo sabendo que essa mesma televisão editaria a informação, alteraria a sua percepção tornando-a, em última análise, num espectáculo de entretenimento.

Recordo-me, também, da perplexidade que senti da primeira vez que vi o “No Logo” da Naomi Klein à venda num hipermercado, próximo do “Código Da Vinci” do Dan Brown, não muito longe dos enlatados. Da mesma forma, não me esqueço de que o “Culture Jam” de Kalle Lasn, o muito activo director da Adbusters, foi publicado pela Harper Collins, uma das maiores editoras norte-americanas, propriedade do magnata Rupert Murdoch, estranhamente um dos visados dos ataques da Adbusters.



Deixo estas notas para justificar a desconfiança com que recebi “The Shock Doctrine – The rise of disaster capitalism”, o novo livro de Naomi Klein mas, também, para confessar o meu progressivo desencantamento em relação a algumas iniciativas de activistas de “guerrilha cultural”.

Soube há poucos dias que os responsáveis pelo “Madonna Weep”, aqueles que vandalizaram os cartazes da H&M talvez tenham sido contratados pela H&M e talvez tudo não tenha passado de uma campanha de marketing (o marketing de guerrilha cada vez mais em voga).



Depois disto, ao ver os últimos trabalhos de ZEVS ou ao ler a notícia de que activistas culturais ocuparam o panteão nacional francês para, clandestinamente, reparar um relógio que aguardava ser reparado há quase meio século, confesso que já não fico particularmente entusiasmado.

Saturday, November 24, 2007





USAR E INTERAGIR: AS NOVAS INTERFACES - ENTREVISTA COM ROBSON SANTOS


Robson Santos é um dos principais consultores de design brasileiros. Formado pela Escola Superior de Desenho Industrial e Doutorado em Design pela PUC-Rio, com investigação na área da Ergonomia e Design de Interfaces, Robson Santos vai-se multiplicando em cursos, conferências e consultoria a empresas. O seu trabalho de investigação vai sendo actualizado no blog Interfaceando.


REACTOR: O Design de Produto contemporâneo vai sendo cada vez mais marcado pela questão da "usabilidade". Eu diria que passámos de um paradigma da "utilidade" (centrado no objecto e em lógicas de produção) para um paradigma da "usabilidade" (centrado no sujeito e em lógicas de utilização). Como vê esta viragem no design?


ROBSON SANTOS: A evolução do Design segue rumo ao atendimento mais aproximado das necessidades das pessoas. O actual panorama de mercado, no qual os consumidores saem de uma posição passiva de somente receberem o que a
indústria lhes impõem e passam a ter consciência de seus direitos, implica uma mudança de posição da indústria em desenvolver produtos e serviços que adicionem valor real à população.

Em paralelo, com a planificação de materiais e processos de produção, a invenção cede lugar à inovação colocando a experiência do usuário como maior objectivo a ser atingido. Assim, o valor simbólico, para o qual a usabilidade
colabora de maneira fundamental, passa a ter maior destaque dentro do campo do design.


R. : Esta mudança seria possível se não se tivesse dado uma clara transformação do mercado, com a mudança de um mercado da produção em massa para um mercado da "personalização em massa"?

R. S. : Certamente, isso é um facto. Além do factor citado, fundamental tem sido a postura do consumidor que, mais informado e mais consciente, exige maior qualidade dos produtores. Também a crescente onda hedonista e o desejo de
diferenciação impulsionaram o estabelecimento de estratégias de "personalização em massa".


R. : Com o desenvolvimento da electrónica as características dos produtos industriais alteram-se e estão em permanente evolução, estou a pensar, por exemplo, no novo i-phone da Apple. Porém, parece-me que muitas vezes o design de interfaces funciona mais como um "trunfo comercial" do que como uma verdadeira mais valia do ponto de vista da funcionalidade...

R. S. : Nem sempre o que o consumidor busca é funcionalidade ou usabilidade. O consumidor sempre busca a satisfação de uma necessidade ou de um desejo. Se encararmos deste ponto de vista podemos entender porque tantas mulheres
ainda utilizam sandálias com salto alto, mesmo sendo comprovadamente prejudicial à coluna! Ou seja design basicamente trata de significados, de símbolos. O citado iPhone é um símbolo de inovação, de diferenciação, de destaque do lugar comum e sua interface passa a ser desejada como um "hype", não como um objecto altamente funcional. Certamente empresas como a Apple observam tendências e criam diferenciais que logo são seguidos mesmo pelos seus concorrentes.

Acredito que, no exemplo citado, o design da interface seja O produto! Por isso é vendida como um trunfo comercial. Nós designer tratamos de elaborar interfaces ente sistemas complexos e o público e isto varia desde um cartaz
de divulgação de uma peça de teatro a uma interface para interação-humano-computador. Em todos os casos, o que se busca é comunicar ao usuário fielmente o propósito do produto, no entanto, por estar inserido numa sociedade do consumo, o produto também deve seduzi-lo.


R. : No Brasil, à semelhança de alguns outros países, a produção de design parece ser marcada por dois rumos: uma orientação high-tech que aposta nas tecnologias e em novas lógicas de relação entre o produto e o usuário; e um outro rumo, low-tech que explora referências culturais e de que os trabalhos dos Campana são o exemplo mais conhecido. Num futuro próximo que evolução prevê em termos de produção de design.

R. S. : Há que se fazer uma diferenciação entre linguagem e tecnologia, ainda que a primeira seja influenciada pela última. É possível desenvolver um produto com alta tecnologia e, ainda assim, expressar valores culturais por meio da linguagem utilizada. Uma opção não necessariamente invalida a outra.

Esta busca por uma identidade nacional sempre existirá, independentemente do qual "hi" ou "low" seja a tecnologia. Por um lado, ao se falar da produção de bens de consumo para mercados globais, a melhor solução sempre será a que for compreendida por um maior número de pessoas. Por outro lado, produtos mais específicos como design de interiores, móveis ou mercado de luxo tendem a seguir um caminho das referências culturais, como no caso citado.

Assim, acredito que a produção de design vai seguir o rumo que a indústria e a comunicação indicarem, com pitadas de inovação em alguns pontos, como sempre houve. Para mim design significa solução de problemas e a produção de design
seguirá o rumo que os problemas apontarem.


R. : Se pudesse dar um único conselho a um jovem designer que conselho seria esse?

R. S. : Conheça o antigo e experimente o novo.

Friday, November 23, 2007




Khoi Vins, designer responsável pelo NYTimes.com destaca elogiosamente o ciclo Personal Views, organizado pela ESAD e comissariado por Andrew Howard. Trata-se de mais uma prova do reconhecimento internacional sobre aquele que é hoje o mais importante ciclo de conferências sobre design gráfico. Trata-se, também, de um evento estimulante por revelar a existência em Portugal de um projecto de Escola de Design esclarecido; de um comissário credível; de um público que responde a solicitações de indiscutível qualidade:

“Now in its fourth year, Personal Views is a unique series of conferences that brings together an unparalleled group of designers, writers and educators from the world of graphic design. The list of past speakers — with recaps and some with video — is impressive." (Khoi Vink)



É hoje inaugurada a instalação “Percursos Inacabados” desenvolvida pelos R2 para a Escadaria Norte da Casa da Música. Aproveitando a ocasião, Frederico Duarte dedica nas páginas do Público um justo destaque a um dos mais importantes ateliers de design gráfico portugueses.



Já foi publicado o último número da Revista Identity. Como haviamos feito referência, Emanuel Barbosa publica um artigo sobre a história recente do design gráfico em Portugal. O artigo é ilustrado com trabalhos de Bürocratik, Firegirl, João Machado, Francisco Providência, Vestígio Design, Shift, Flúor e MyBrand. Reflectindo sobre a prática do projecto mas, também, sobre a teoria do design, Emauel Barbosa analisa inclusivamente a importância da blogosfera destacando, entre outros blogs, o Reactor.



Nos dias 26 e 27 de Novembro terá lugar na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, o colóquio interdisciplinar Luso-Brasileiro "Política, Cultura e Artes". Como se cruzam estes campos? Em que lugares se (des)encontram? Que narrativas convocam? Que jogos estimulam? Que crenças legitimam? Que resistências são possíveis? Que olhares se multiplicam? Que ditos e interditos se tecem? E que sujeitos para estas artes, que corpos para esta cultura - o que arde, ainda, quando tudo estiola? Por que esperamos quando tudo urge"? São algumas das questões a trabalhar por autores como Leonel Santos, Rui Magalhães ou Né Barros.

Nos dias 5 e 6 de Dezembro, destaque para outra conferência internacional, esta a ocorrer no CCB, "Imagem e Pensamento". Sobre as relações entre imagem e pensamento irão trabalhar Martin Jay, Alberto Samaniego, Bernardo Pinto de Almeida ou Teresa Cruz entre outros. Em participarei com uma comunicação intitulada "As imagens luminosas e as imagens sombrias". A par da conferência haverá uma exposição sobre o tema no Museu/Colecção Berardo.

Um último destaque para o importante artigo de opinião que Augusto M. Seabra publicou na Arte Capital. Começa assim: "O relevo das políticas públicas da Cultura é de indesmentível menoridade no quadro do actual governo – com todas as consequências que se verificam na gestão corrente e, mais grave ainda, nas que a prazo serão decorrentes de uma situação de maioria absoluta que garante um governo de legislatura."

Wednesday, November 21, 2007



MAÇÃ CASTANHA?
APPLE BRAUN?

Talvez não haja design que não envolva, sempre, alguma forma de redesign. Talvez a mais valia dos produtos de design industrial contemporâneo esteja mais centrada em inovações de Software do que de Hardware. Talvez sejam só coincidências. Talvez, mas a verdade é que de cada vez que a Apple lança um novo produto eu lembro-me de Dieter Rams.


Dieter Rams é um designer com o qual tenho uma relação estranha. Se o reconheço como a figura maior do neo-funcionalismo da segunda metade do século XX não consigo evitar em ver no seu rigor funcionalista uma outra espécie de formalismo. Sóbrio, minimal mas, em todo o caso, formalismo. Se admiro o seu pensamento, a defesa de um design socialmente empenhado, por outro lado não me esqueço de que o vi terminar uma entrevista dominada pela defesa de um design sustentável, dada ao magazine na Experimenta, a entrar no seu potente (e poluente) Ferrari.

Mas será de mim ou o Rádio T1000, desenhado por Rams para a Braun em 1962, é muito parecido com o McBook Pro? Será de mim ou a calculadora electrónica ET 33, desenhada por Rams para a Braun em 1977, é bastante idêntica ao iPhone?



São, de facto, inúmeras as semelhanças entre produtos Braun das décadas de 50/70 e produtos Apple contemporâneos. Coloca-se a questão não estará a Maçã (Apple) a ficar Castanha (Braun)?

Tuesday, November 20, 2007



AN INCOMPLETE MANIFESTO FOR GROWTH
Bruce Mau

1. Allow events to change you. You have to be willing to grow. Growth is different from something that happens to you. You produce it. You live it. The prerequisites for growth: the openness to experience events and the willingness to be changed by them.


2. Forget about good. Good is a known quantity. Good is what we all agree on. Growth is not necessarily good. Growth is an exploration of unlit recesses that may or may not yield to our research. As long as you stick to good you'll never have real growth.


3. Process is more important than outcome. When the outcome drives the process we will only ever go to where we've already been. If process drives outcome we may not know where we’re going, but we will know we want to be there.


4. Love your experiments (as you would an ugly child). Joy is the engine of growth. Exploit the liberty in casting your work as beautiful experiments, iterations, attempts, trials, and errors. Take the long view and allow yourself the fun of failure every day.


5. Go deep. The deeper you go the more likely you will discover something of value.


6. Capture accidents. The wrong answer is the right answer in search of a different question. Collect wrong answers as part of the process. Ask different questions.


7. Study. A studio is a place of study. Use the necessity of production as an excuse to study. Everyone will benefit.


8. Drift. Allow yourself to wander aimlessly. Explore adjacencies. Lack judgment. Postpone criticism.


9. Begin anywhere. John Cage tells us that not knowing where to begin is a common form of paralysis. His advice: begin anywhere.


10. Everyone is a leader. Growth happens. Whenever it does, allow it to emerge. Learn to follow when it makes sense. Let anyone lead.


11. Harvest ideas. Edit applications. Ideas need a dynamic, fluid, generous environment to sustain life. Applications, on the other hand, benefit from critical rigor. Produce a high ratio of ideas to applications.


12. Keep moving. The market and its operations have a tendency to reinforce success. Resist it. Allow failure and migration to be part of your practice.


13. Slow down. Desynchronize from standard time frames and surprising opportunities may present themselves.


14. Don’t be cool. Cool is conservative fear dressed in black. Free yourself from limits of this sort.


15. Ask stupid questions. Growth is fueled by desire and innocence. Assess the answer, not the question. Imagine learning throughout your life at the rate of an infant.


16. Collaborate. The space between people working together is filled with conflict, friction, strife, exhilaration, delight, and vast creative potential.


17. ____________________. Intentionally left blank. Allow space for the ideas you haven’t had yet, and for the ideas of others.


18. Stay up late. Strange things happen when you’ve gone too far, been up too long, worked too hard, and you're separated from the rest of the world.


19. Work the metaphor. Every object has the capacity to stand for something other than what is apparent. Work on what it stands for.


20. Be careful to take risks. Time is genetic. Today is the child of yesterday and the parent of tomorrow. The work you produce today will create your future.


21. Repeat yourself. If you like it, do it again. If you don’t like it, do it again.


22. Make your own tools. Hybridize your tools in order to build unique things. Even simple tools that are your own can yield entirely new avenues of exploration. Remember, tools amplify our capacities, so even a small tool can make a big difference.


23. Stand on someone’s shoulders. You can travel farther carried on the accomplishments of those who came before you. And the view is so much better.


24. Avoid software. The problem with software is that everyone has it.


25. Don’t clean your desk. You might find something in the morning that you can’t see tonight.


26. Don’t enter awards competitions. Just don’t. It’s not good for you.


27. Read only left-hand pages. Marshall McLuhan did this. By decreasing the amount of information, we leave room for what he called our "noodle."


28. Make new words. Expand the lexicon. The new conditions demand a new way of thinking. The thinking demands new forms of expression. The expression generates new conditions.


29. Think with your mind. Forget technology. Creativity is not device-dependent.


30. Organization = Liberty. Real innovation in design, or any other field, happens in context. That context is usually some form of cooperatively managed enterprise. Frank Gehry, for instance, is only able to realize Bilbao because his studio can deliver it on budget. The myth of a split between "creatives" and "suits" is what Leonard Cohen calls a 'charming artifact of the past.'


31. Don’t borrow money. Once again, Frank Gehry’s advice. By maintaining financial control, we maintain creative control. It’s not exactly rocket science, but it’s surprising how hard it is to maintain this discipline, and how many have failed.


32. Listen carefully. Every collaborator who enters our orbit brings with him or her a world more strange and complex than any we could ever hope to imagine. By listening to the details and the subtlety of their needs, desires, or ambitions, we fold their world onto our own. Neither party will ever be the same.


33. Take field trips. The bandwidth of the world is greater than that of your TV set, or the Internet, or even a totally immersive, interactive, dynamically rendered, object-oriented, real-time, computer graphic–simulated environment.


34. Make mistakes faster. This isn’t my idea -- I borrowed it. I think it belongs to Andy Grove.


35. Imitate. Don’t be shy about it. Try to get as close as you can. You'll never get all the way, and the separation might be truly remarkable. We have only to look to Richard Hamilton and his version of Marcel Duchamp’s large glass to see how rich, discredited, and underused imitation is as a technique.


36. Scat. When you forget the words, do what Ella did: make up something else ... but not words.


37. Break it, stretch it, bend it, crush it, crack it, fold it.


38. Explore the other edge. Great liberty exists when we avoid trying to run with the technological pack. We can’t find the leading edge because it’s trampled underfoot. Try using old-tech equipment made obsolete by an economic cycle but still rich with potential.


39. Coffee breaks, cab rides, green rooms. Real growth often happens outside of where we intend it to, in the interstitial spaces -- what Dr. Seuss calls "the waiting place." Hans Ulrich Obrist once organized a science and art conference with all of the infrastructure of a conference -- the parties, chats, lunches, airport arrivals — but with no actual conference. Apparently it was hugely successful and spawned many ongoing collaborations.


40. Avoid fields. Jump fences. Disciplinary boundaries and regulatory regimes are attempts to control the wilding of creative life. They are often understandable efforts to order what are manifold, complex, evolutionary processes. Our job is to jump the fences and cross the fields.


41. Laugh. People visiting the studio often comment on how much we laugh. Since I've become aware of this, I use it as a barometer of how comfortably we are expressing ourselves.


42. Remember. Growth is only possible as a product of history. Without memory, innovation is merely novelty. History gives growth a direction. But a memory is never perfect. Every memory is a degraded or composite image of a previous moment or event. That’s what makes us aware of its quality as a past and not a present. It means that every memory is new, a partial construct different from its source, and, as such, a potential for growth itself.


43. Power to the people. Play can only happen when people feel they have control over their lives. We can't be free agents if we’re not free.

Bruce Mau, Life Style, Phaidon Press, New York and London, 2000.

Monday, November 19, 2007



NADA

No momento em que o número 10 da revista NADA está pronto para ser lançado, torna-se mais do que fundamentada a ideia com que se ficou mal o primeiro número da revista nos caiu nas mãos: a NADA é um projecto editorial exemplar no contexto nacional e uma das melhores revistas de língua portuguesa a levar a cabo a difícil reflexão sobre esse território complexo que é a contemporaneidade. O design de manuel Granja está melhor que nunca; a Coordenação editorial de João Urbano assegura que a identidade do projecto não se abala, pelo contrário reforça-se, pelas aberturas temáticas que são feitas. Sendo um "objecto" exemplar a NADA tem merecido, enquanto objecto de reflexão autónoma, uma atenção insuficiente. Deixo o link para um muito bom post de Mário Moura que se apresenta como uma justa excepcção a essa desatenção.

Sunday, November 18, 2007

AS MELHORES "CAPAS" DE 2007

O The Book Design Review acaba de publicar uma lista das melhores "covers" de livros publicados em 2007. Antecipando a apresentação de escolhas, nacionais e internacionais, feitas pelo Reactor, aqui ficam alguns destaques:

"Unmarketable", design de Rob Carmichael.

"Words without borders", design de Helen Yentis.

"Salt", design de Jaya Miceli.

"The collected poems 1956-1998", design de High Design.

"Darkness at noon", design de Paul Sahre.

Friday, November 16, 2007



FOI VOCÊ QUE PEDIU MARKETING DE GUERRILHA?
ENTREVISTA COM HUGO TORNELO

Hugo Tornelo formou-se em design na Escola Superior de Design do IADE tendo prosseguido a sua formação no criativo Fun Lab da Design Academy de Eindhoven. De regresso a Portugal integrou um dos projectos mais originais do actual panorama do design português, a TORKE uma empresa de Marketing de guerrilha.

REACTOR: A influência do movimento "culture jammer" na cultura contemporânea é indiscutível. Colectivos como os Adbusters e autores como Bansky, surgem-nos como referências fortes de um trabalho de arte/design com
um forte cunho de intervenção. Em todo o caso, em Portugal expressões como "marketing de guerrilha" ou "design activista" são ainda algo estranhas. Dentro deste contexto como se explica o surgimento da Torke?

HUGO TORNELO: A Torke surgiu de uma lacuna no mercado da comunicação existente em Portugal direccionado para um novo tipo de comunicação de marcas, o Marketing de Guerrilha.
Fundada por pessoas já com o Know-how a nível de ferramentas de comunicação, a Torke procura trazer a comunicação de marcas a um nível diferente utilizando métodos não convencionais. Em certa medida pode haver um cruzamento entre o movimento culture jamming e o marketing de guerrilha quando se fala na saturação da comunicação e de veículos dos mesmos, mas o culture jamming enquanto ferramenta activista procura aniquilar e subverter a comunicação de grandes marcas, o marketing de guerrilha surge como uma ferramenta diferente de comunicação para estas mesmas marcas.

R. : Trata-se, no fundo, de assumir o papel catalizador do designer, tomar consciência de que o designer tem, no contexto das sociedades neo-liberais, de se assumir como mediador altamente comprometido entre as pessoas e a sociedade?

H. T. : Sem dúvida de que o designer tem um papel mediador quando o nosso objectivo é comunicar para pessoas.

R.N : Neste sentido, poder-se-á dizer que, perante o crescimento de um design cada vez mais orientado para os consumidores, a Torke se dirige, em primeiro lugar aos cidadãos?

H. T. : A Torke procura acima de tudo chegar às pessoas no seu dia-a-dia no seu trajecto rotineiro de A a B, é muitas vezes aqui que procuramos uma intervenção. Tentamos assim que a assimilação da comunicação seja digerida de uma maneira diferente.

R. : O Hugo Tornelo passou pela Design Academy de Eindhoven, como é que o seu percurso enquanto designer o levou à Torke?

H. T. : Foi uma pura coincidência, depois de ter chegado da Holanda com um grande input a nível criativo, acabei por descobrir a Torke que tinha muitas semelhanças com Fun Lab Master na Design Academy, este último debruçava-se para o estudo da cultura da experiência enquanto produto económico, onde o espectador/público torna-se num participante/personagem de uma experiência criativa.

R. : Sente-se integrado na actual "cultura de design" portuguesa?

H. T. : Não muito, penso que a cultura do design portuguesa ainda está muito
direccionada puramente para uma indústria massiva e convencional. Apesar de haver designers a fazer abordagem diferentes penso que ainda seja um núcleo pequeno e fechado

R. : Que projectos tem, neste momento, "entre mãos" e que projectos vão ganhando forma na sua cabeça por estes dias?

H. T. : Existem diversos projectos mais ainda numa fase embrionária, como "insatisfeito nato" existe sempre uma procura para fazer mais e de me envolver em projectos diversos.

Tuesday, November 13, 2007




REGRESSO A ROMA

Em Agosto do ano passado, por ocasião da Exposição da Culturgest, publiquei na Arte CapitalArte Capital um ensaio de apróximação ao trabalho de ROMA Publications. A recente passagem de Roger Willems por Portugal (esteve na Arco no último dia 20) levou-me a regressar a um lugar de que gosto particularmente, onde sempre me perco e reencontro, um lugar onde, como escrevia no texto anterior, “as coisas podem não ter fim”.

ROMA é um acrónimo criado a partir das duas primeiras letras dos nomes próprios de Robert Willems e Mark Manders que em 1998 criaram oficialmente um projecto editorial sui generis na medida em que o trabalho de edição funciona como espaço de ancoragem de ideias, pessoas e projectos que partilham afinidades. Se à primeira leitura, uma certa arborescência do projecto ROMA o parece indefinir, sob um olhar mais atento há um sentido que deixa revelar uma espécie de espaço imaginário, fisicamente esquivo, que funciona como lugar ad quem e ad quo da ROMA, esse espaço é o design concebido como horizonte de comunicação utópica e, neste sentido, espaço que se procura manter imune às regras do mercado da arte e do design.

"The Whole world - Without me" (2004/07) de Oksana Pasaiko.

O modo a partir do qual, habitualmente, procuramos compreender alguma coisa corresponde a um processo de definição. Estabelecendo identidades e diferenças, forçamo-nos por reduzir a complexidade das coisas à (pelo menos aparentemente) simplicidade de uma definição. Tal definição, se apressada, torna-se relativamente ao projecto ROMA não apenas difícil como desaconselhável.

"Five Minutes to die" (2004) de Iñaki Bonillas.
"Five Minutes to die" (2004) de Iñaki Bonillas.

Três exemplos: 1) Difícil e desaconselhável é a anulação das especificidades do projecto de Mark Manders e Roger Willems integrando-o, sem mais, na (in)definição do design holandês. Se por um lado existe uma espécie de dutch touch que perpassa por muita da produção gráfica holandesa, por outro lado essa cultura de design corresponde mais à coexistência de diferentes linguagens e de diferentes perspectivas sobre o design e, muito menos, a efeitos de replicação do mesmo. É indiscutível que o projecto ROMA herda tesouros da cultura do design holandês - que em traços gerais podemos caracterizar reconhecendo a existência de: a) uma fortíssima tradição projectual recente à qual podemos associar os nomes de Wim Crouwell, Berry van Gerwen ou Michiel Uilen; b) a existência de uma “cultura pública” de design gráfico, pensemos nas identidades corporativas desenhadas pelo Studio Dumbar, na riqueza dos cartazes de espectáculos (uma série deles desenhados pelos estúdios Mevis & Van Deursen ou AAP Designers fazem já parte da história do design gráfico), na profusão de elementos de comunicação urbana (flyers, stickers, tags), nos inúmeros eventos públicos como os organizados pela Mediamatic; c) a existência de apoios e instituições protectoras do design editorial como a CPNB (Foundation for the collective promotion of the Dutch book), bem como a existência de inúmeros museus e galerias com lógicas de funcionamento e processos de fidelização de públicos muito interessantes; d) a existência de uma “cultura crítica” responsável pela teorização da prática, garante do seu enriquecimento e dinamização, pensemos, por exemplo, em autores como Max Bruinsma ou Mieke Gerritzen – mas sabe pôr a herança a render, sabe, a um tempo, honrá-la e relacionar-se com ela com a criatividade e o pragmatismo do deserdado. 2) Difícil e desaconselhável é, também, procurar pensar o projecto ROMA Publications “apenas” como um projecto editorial e, tarefa ainda mais desaconselhável, como um entre muitos projectos editoriais de pequena dimensão e espírito independente existentes na Holanda. É verdade que, sem dificuldade, podemos encontrar outros projectos editoriais que, confundindo-se um pouco com a actividade dos seus dinamizadores, ganham uma dimensão quase rizomática, isso acontece com editoras de maior dimensão como a 010 Publishers (que reflecte o dinamismo e os interessses de Hans Oldewarris e Peter de Winter) ou a Em. Querido’s e acontece, de um modo mais evidente, com editoras menores e ateliers de design (e até mesmo escolas como Jan van Eyck Akademie) com forte dinâmica editorial como Veenman Publishers ou a [Z]OO Producties. No entanto os mínimos denominadores comuns que possamos identificar nos vários projectos serão sempre desviantes relativamente à efectiva compreensão daquilo que autenticamente mobiliza cada um deles. 3) Difícil se torna, finalmente, uma definição disciplinar que limite o campo de trabalho da ROMA. A exposição presente na Culturgest é, a este título, claríssima. Ali coexistem a presença de vídeos, desenhos, esculturas, fotografias, instalações, intervenções site-specific, livros e jornais. Cada obra é desafiante, porque nela se representa um jogo marcado por tensividades entre o papel do autor e do espectador; entre o estatuto da cópia e do original; entre a interdição e a permissão; entre a rigidez ideológica e a abertura utópica. ROMA é assim espaço de encenação de uma forma de comunicação que partindo de referências canónicas sobre a obra de arte, sobre o artista e as lógicas de exposição, as repensa a partir do envolvimento de referências de design (entendido, à maneira de ULM como acção socialmente eficaz), assim se constrói o território que é ROMA e as suas premissas críticas: da tensão entre autor/espectador resulta a intenção de gerar um projecto colectivo, a obra dá-se a aberturas relativamente ao receptor que assim a pode continuar seja fisicamente seja conceptualmente; da tensão entre original/cópia, promove-se a valorização do que é reproduzido, apelando ao reconhecimento de uma aura que individualiza a cópia e a torna única, o que envolve, necessariamente, a acção do receptor-autor; à tensão entre interdição e permissão, defende-se um envolvimento responsável, esquissando-se formas de responsabilidade que, por vezes, se parecem com formas de intimidade; à tensão entre rigidez ideológica e abertura utópica, propõe-se uma ética comunicativa, participada, perspectiva sob a qual a democracia e a amizade se tendem a aproximar. 


Para a exposição da Culturgest a ROMA Publications concebeu um livro, o seu título: “Books make friends/Os livros fazem amigos”. Poderá ser considerado o catálogo da exposição na medida em que nele encontramos a apresentação dos 90 livros publicados pela editora, bem como referências aos trabalhos não-editoriais expostos e textos (de Miguel Wandschneider, de Christoph Keller e um último e excelente de Dieter Roelstraete) sobre o projecto. No entanto, este livro é subsumido pela exposição, tornando-se dela constitutivo. Coisa estranha num catálogo que, tradicionalmente, tende a explorar distanciamentos sobre a exposição de modo a permitir a sua inteligibilidade. 

Desta forma “Os livros fazem amigos” constitui-se não tanto como catálogo que nos remete para a exposição, mas como um fragmento da própria exposição, um de entre noventa. Esta numeração dos livros, por sua vez, cedo se revela despistante para o espectador: por um lado porque cada livro fez parte de uma tiragem que permite a multiplicação do mesmo; por outro lado porque aos livros se chega e dos livros se parte, pela Galeria da Culturgest haviam folhas, fotografias, esculturas cujo sentido se constrói tecendo ligações de alguns desses objectos para determinados livros e de determinados livros para certos objectos.

"Parallel Encyclopedia" de Batia Suter (2007).

A partir de um processo de possível duplicação continua do sentido dos objectos expostos, apresentados como “duplos” - como a escultura de Mark Manders “Chair/Staged Android (reduced to 88%)” que sabemos ser uma reconstrução a 88% de uma peça entretanto destruída, como na extraordinária “Paralell Encyclopedia” de Batia Sutter que se constitui como uma espécie de projecto taxinómico de exploração de semelhanças entre disemelhantes ou, ainda, como o lindíssimo “Short sad text (based on the borders of 14 countries)” onde vemos uma de duas peças de Oksana Pasaiko ao mesmo tempo que sabemos ter sido a outra peça largada numa casa de banho pública em Oslo – a partir, também, de um processo de construção de alteronímias – o exemplo simbolicamente flagrante é dado pelas quatro séries de fotografias da autoria de Marije Langelar, autor fictício que representa a união de dois autores representados na exposição – a partir destes processos o visitante da exposição é, assim, convidado a encontrar afinidades electivas entre o que está presente e o que está ausente e nesse jogo é o próprio espectador que entra (consciente ou inconscientemente) no processo de autoria.


"Lógicas Desviadas" de Irene Kopelman (2007).

O projecto ROMA Publications alicerça-se em posições que embora subtilmente apresentadas se tendem a revelar muito claras: a afirmação de uma autoria colectiva associada às obras de arte e de design. As obras não são terminadas no momento em que um determinado autor as liberta, elas dão-se a ser continuadas e permanentemente modificadas. O museu ao impor regras artificiais de conservação (como a vitrina que protege o sabão de “Short sad text”) apenas consegue fixar um momento da vida da obra, agarrar uma determinada cristalização, na certeza de que a existência autónoma da coisa não pode ser prevista nem controlada, o que ela é apenas pode ser aproximadamente construído pela nossa imaginação (como quando imaginamos diferenças entre o sabão exposto na Culturgest e aquele que foi deixado na casa de banho de Oslo) mas esse exercício não nos aproxima do “estado actual” do objecto mas antes nos confronta com uma imagem que, uma vez materializada, se tornará uma outra obra. 


ROMA Publications é uma exposição sobre livros e uma exposição cheia de livros, democraticamente dispostos de várias formas, horizontalmente, verticalmente, abertos, fechados, que podemos olhar e tocar. Há livros de diferentes cores e tamanhos, há livros que nos atraem pelo apelo visual das capas e há livros sem capa como se alguém as tivesse tomado para si tornando-as parte – quem sabe? – de um outro livro, há livros que são só uma imagem e há livros que são só texto, elegantes manchas tipográficas a partir de tipos de letra familiares (Helvética, Times, Futura), há livros em devir-música e há muita coisa – ideias, memórias, desejos, mãos, dedos e olhos – em devir-livro. ROMA Publications é uma exposição sobre livros, dissemos. Nela se conta de novo a história da bela adormecida, ou melhor, da beleza que aguarda ser despertada em alguns livros. O seu príncipe, já o sabemos, é o leitor e o beijo corresponde a uma particular tarefa interpretativa a partir da qual a relação entre o leitor e o livro se consuma. Ler corresponde, na expressão de Hamann, a salvar o livro da morte: retira-se da morte o que se reconhece vivo, o que se vivifica.

"Beauty Unrealized" (2007) AAVV.

A exposição ROMA Publications que a Culturgest acolheu apresentava bem um projecto capaz de lançar, secreta mas insinuadoramente, ao visitante (o seu leitor) esse chamamento para que ele não se limite a olhar o que está exposto mas que procure ver. Que procure naqueles caminhos os seus caminhos, que encontre por entre pequenos pensamentos tristes os seus próprios pequenos pensamentos, que descubra, naqueles (como noutros) livros, lugares. Lugares onde as coisas podem não ter fim. 








Sunday, November 11, 2007




No momento em que inicío este “post”, guardo ainda a força das últimas palavras de Maria Filomena Molder no livro, de belíssimo título, sobre Hermann Broch, “O Absoluto que pertence à terra”: “Ele padeceu e quis contar o padecimento das imagens que à força de rapidez se imobilizam, sem elo, sem enleio, perdendo o seu valor simbólico, uma tradição onde já não se pode viver.” Não se trata, neste “padecimento das imagens” mas também neste “padecimento nas imagens”, de uma aproximação, certeira, à nossa condição?

Da Exposição “Come, come into my world” presente na Fundação Ellipse conheço apenas o pouco que um desdobrável graficamente irrepreensível (com a assinatura de Barbara Says…), encontrado entre as páginas do Público, me trouxe. A visita ao Site – um excelente site! – despertou em mim a vontade de responder àquele apelo que as obras de arte (mesmo que pela voz dos seus curadores) tem a capacidade de nos lançar: come, come into my world.

Havia recebido há algum tempo, gentilmente enviado pelo André Cruz, o primeiro número da Nexus, um singular projecto editorial, auto-apresentado como um “registo das mutações contemporâneas", que ausculta, através dos instrumentos do projecto (as suas autoras são formadas em arquitectura), as ligações contemporâneas, desenvolvendo inteligentes entrevistas com personalidades diferentes como Vera Mantero, José Bragança de Miranda ou Marta Menezes (para citar apenas as que li). As opcções gráficas de André Cruz são convincentes e as ilustrações de Catarina Martins criam subtis separações entre conteúdos nos quais, laboriosamente, vamos afinal descobrindo continuidades.

Mário Moura, no último “post” publicado no Ressabiator retoma a reflexão sobre a “neutralidade” em design introduzindo um apontamento de leitura barthesiana. Sobre este assunto, uma autora de que gosto particularmente, Maria Ledesma, escrevia que “el diseño al estar volcado hacia la sociedad, al tener como fin la inscripción en su dinámica completa y contradictoria, siempre está incluido en un sistema de poder y contrapoder, de opresión interna y externa, de exclusions y permeabilidades que delimitan la acción del diseñador: por lo tanto, cada vez que actúa, el diseñador toma partido.”.

E se o Dr. House fosse um designer? Confesso-vos que foi a pergunta que coloquei quando li o interessante “post” do Sérgio Lavos: “House e o tabaco”. Lembrei-me também do Enzo Mari e da ideia que os designers deviam ter o seu próprio juramento de Hipócrates: “A ética é o objectivo de todo o projecto de design”(E. Mari).

Wednesday, November 07, 2007



LOESCH, UWE (n. 1943)

Uwe Loesch, nasceu em 1943 em Dresden, na antiga RDA. O local de nascimento não será neste caso irrelevante, na medida em que Dresden era a “capital” do design gráfico da “Alemanha comunista”, onde a excelência do trabalho de designers como Karl-Heinze Lange exercia forte influência sobre os jovens designers. Em todo caso, Loesh “saltou o muro” cedo e com 21 anos iniciou os estudos em Design Gráfico na Peter-Behrens Academy de Dusseldorf onde se formou em 1968.

"The People who refused to listen" (1968)

Por esta altura surgem os primeiros trabalhos de Uwe Loesch e à medida que se vai definindo uma linguagem gráfica singular, muito vincada, com um uso muito particular da tipografia e experimentando lógicas de legibilidade que antecipam recursos usados pelo desconstrutivismo, define-se, igualmente, uma consciência social e política fortes, expressa com clareza no trabalho gráfico, na escolha dos trabalhos a aceitar, nas declarações públicas e na sua própria imagem pública definitivamente marcada pela utilização de um sapato preto no pé esquerdo e de um sapato branco no pé direito.

"Euroshop 78" (1978)

"A+A 79" (1979)

"Punktum" (1983)


A sua obra – amplamente premiada – está representada em inúmeras colecções de diferentes museus, destacando-se o MoMA de Nova York, o Israel Museum de Jerusálem ou o Le Musée de la Publicité de Paris.

"You bet your life!" (1984)

"Sign of the time" (1987)

"We must meet our fate" (1991)

"Sit In" (1993)

"Little Boy" (1995)

"www.scheisse.de (2000)

"Dieter Jung" (2003)

"AGI Congress" (2005)

"Tomaszewski" (2006)

Tuesday, November 06, 2007



O CIRURGIÃO INGLÊS
CONSIDERAÇÕES SOBRE A PERMANÊNCIA DO CONCEITO DE DESIGN

Eduardo Côrte-Real


"Dessin (l´art du-) Se compose de trois choses: la ligne, le grain, et le grain fin; de plus, le trait de force. Mais le trait de force, il n´y a que le maître seul qui done."

Gustave Flaubert
Diccionaire des Idés Reçues

Porque que é que esta palavra Design aparece sempre sublinhada a vermelho no meu processador de texto?

Se, no séc. XVI, Francisco d'Hollanda tivesse escrito em word com corrector ortográfico para português a palavra Desenho, que tão esforçadamente procurava mostrar aos seus leitores, também daria erro. Desenho era uma novidade com cem anos em Itália. Durante esse século (do fim do séc. XIV ao principio do séc. XVI), o disegno de Cennino Cenini, ainda preso à ideia de registo gráfico, veio a englobar o conceito de projecto.
As propostas de Hollanda, Vasari e Zuccari, entre outros, de definir Desenho constituíam-no como um vasto sistema que albergava uma multiplicidade de actividades que faziam fé no registo gráfico como modo de atingir o controle formal para os objectos a produzir.
Em Espanha, onde a palavra Dibujo se manteve, ao contrário do nosso Debuxo (curioso, debuxo já não se usa mas não aparece sublinhado), o Diseño adquiriu o significado de Design.
Tudo se parece jogar entre os prefixos de e di. Disegno Diseño, Desenho, Design, Dessin soam como semelhantes. Design, na enciclopédia britânica é identificado como verbo, assimilado para o inglês médio através do francês.
Num dicionário da Internet encontro que Designo, em latim, queria dizer: destacar, designar, descrever e definir. O que parece ressaltar destes significados é a sua relação com processos essenciais do pensamento humano.
Vamos então, tentar, a partir da tradução de Designo, definir Design.

1º - Destacar: Da experiência de mundo é possível isolar factos, objectos, formas. Antes de qualquer juízo, a nossa atenção pode focalizar-se, hierarquizar o objecto de uma experiência sensível. (Olho para o écran do meu computador esquecido da chuva que cai lá fora, da estante de livros que está à minha direita, da porta aberta do escritório, do ícone que daria inicio a uma tabela de excel, etc., etc).
Sendo eu sujeito a estar no tempo e, consequentemente sendo actor, no sentido de praticar acções, poderei categorizar essas acções? Destaco, em primeiro lugar que aquilo que procuramos definir é uma acção humana.
Ao colocar esta questão tenho que postular que o humano é actuante. Ou seja, que há um modo de reconhecer o humano que passa pela avaliação do mundo como situação antes e depois do movimento (acção) do humano. Esta premissa geral baseia-se no facto da indissociabilidade do humano e do Tempo que, de uma forma reflexiva, o posiciona.
Ao termos inventado a História sabemos que agimos com consequências. Ou sabemos que o modo como construímos mundo depende desse sistema de causalidade. Agimos e temos tempo para observar as consequências das nossas acções.
O Humano é, então, a possibilidade de o Tempo poder ser aferido como uma multiplicidade de resultados dos quais apenas um foi concretizado. Isto é, obviamente, a construção humana do tempo e nenhum de nós poderá ter outra visão diferente. Agir comporta participar numa linha definida, apenas porque está definida pela sua visibilidade posterior.
O primeiro ponto de vista a partir do qual posso destacar aquilo que procuramos definir é o da Ética. Na construção do Homem moderno, sobretudo a partir de Alberti, os aspectos éticos foram sobrelevados. Na construção do humano como ser que projecta recorrendo à técnica e à arte (seria perigoso falar aqui de Estética), Alberti socorreu-se da Virtude, Virtús dos romanos, Aretê dos gregos.
É claro, neste momento, que o primeiro modo de destacar que usarei se prende com a História. Destaco a idade moderna e a idade contemporânea como períodos onde pode ser destacado aquilo que procuramos definir.
Os dois mais importantes tratados de Alberti: De Pictura (1435) e De Re Aedificatoria (1443-1452) constituem-se como um manual de construção do homem como ser social mais do que como tratados das disciplinas a que se dedicam. A questão central em De Pictura é a representação. Não a representação arbitrária e sensível mas a representação como resultado da adopção de um processo maquínico indesmentível. Ao De Pictura devemos, primeiro, uma definição de Desenho quando Alberti escreve no início: "Signum hoc loco apello quicquid in superficie ita insit ut possit oculo conspici". Este signum é traduzido para segno, ao que juntando o prefixo di que indica acção, obtemos disegno. O disegno é, então a acção de produzir sinais - signos. Em segundo lugar, devemos a Alberti a definição e codificação da perspectiva. Embora a "invenção" perspectiva seja recordada sobretudo pela sua aplicação na Pintura ela comporta mais do que o seu destino pictórico. A perspectiva é a grande máquina do Renascimento porque normaliza a representação. Ao propor um método rigoroso de representação, mais do que obter verosimilhança para as obras pictóricas, a constuzzione legitima alarga a possibilidade de um mundo a haver através da sua visibilidade. As tábuas de Urbino, do círculo de Piero della Francesca exemplificam este processo. Outro facto pertinente é o uso da aparelhagem conceptual da geometria euclidiana. Ponto, recta, plano e volume são os elementos da construção de um edifício abstracto, hipotético – dedutivo que constrói o mundo artificial. A possibilidade do projecto resulta da aceitação de um protocolo com o universo euclidiano como aquele que é logicamente válido para entender o espaço e aquilo que o povoa. Qualquer criação humana visível pode ser descrita à luz daquela aparelhagem conceptual até porque passa a ser feita com o seu concurso.
O Trabalho de Alberti abre a porta ao projectista e, sobretudo, ao projectista, que usa recursos gráficos para projectar.
Consequentemente destaco de todas as acções humanas, as realizadas desde a idade de Alberti até hoje, que se caracterizam pela ideia de projecto. Dessas destaco, ainda, aquelas que aceitam o registo gráfico como o lugar onde é possível tornar visível o universo euclidiano


2º - Designar: Se aquilo que foi destacado for suficientemente compacto e repetível como experiência posso atribuir-lhe um nome. Naturalmente que não posso atribuir um nome à experiência de comer pão com queijo e marmelada num fim de tarde de Verão debaixo de uma ramada enquanto os insectos zumbem e os pássaros procuram acomodar-se nas tangerineiras mas posso atribuir o nome queijo que reunirá todas as formas finais de um processo particular de transformar o leite. A possibilidade de designar comporta a possibilidade de operar com conceitos que, ainda que vagos, encontram uma existência provisória num plano lógico.
Ao propor um nome para esta acção das outras destacada faço-o recorrendo a uma palavra de uma língua que não é a minha. Ocorre-me o D. Quixote de Mènard do conto de Borges. Mènard, francês, escreveu, nos anos trinta do século XX, um D. Quixote em tudo igual ao de Cervantes. Sem nunca esclarecer se este outro Quixote brotou da imaginação de Mènard ou foi copiado, Borges, alerta-nos para o facto de, por ter sido escrito por um francês em castelhano clássico e no séc. XX, o livro ser em tudo diferente, embora igual.
Escolho então Design. Chegada ao inglês provavelmente por via normanda, a palavra terá ganho o seu sentido projectual pleno sobretudo como resultado da querela sobre o Disegno encetada no séc. XVI em Itália. No final do séc. XVI, artistas ingleses como Inigo Jones chegaram viajaram para Itália com propósitos semelhantes aos de Hollanda. A querela sobre o primado das artes tinha-se esbatido dando origem às academias del Disegno de Florença e Roma. Que palavra poderia Inigo Jones trazer para Inglaterra que significasse Disegno? As definições de Disegno de Zuccari, ideólogo da Academia de Roma, aproximam-se de um sentido globalista e divino. Uma palavra inglesa como drawing não poderia abarcar a multiplicidade de actividades que o Disegno englobava.
Escolho Design, no início do séc. XXI, porque alguém já o fez. Quase em todos os cantos do mundo, a palavra é reconhecida e é aplicada. Neste processo de aplicação viemos a encontrar-nos com a ruptura da demarcação que tinha feito anteriormente. Uso Design para designar (a aliteração é irresistível) factos, objectos e acções que ultrapassaram o registo gráfico e o universo euclidiano. Podemos dizer que a instabilidade do humano, criada desde o fim das luzes e do início da idade contemporânea e que se inaugura com o Romantismo, com a designação abrangente de Design, que se assume como um grande sistema interdisciplinar, se pacificará num paradigma semelhante ao criado pelo Desenho para a Idade Moderna. De facto, ao elencarmos, todas as atribuições da palavra Design, reparamos que ela tende a absorver as artes visuais, as engenharias, a arquitectura, a biotecnologia, a ciência, o jogo e, obviamente, a participar decisivamente na criação da cibercultura. Em resumo abrupto, o Design, hoje, participa em qualquer construção de mundo "artificial" sujeito a uma prefiguração a que chamamos projecto. Aquilo a que posso chamar Design com segurança é todo o processo que produz uma representação de algo a produzir.
Certas tribos da floresta amazónica não têm uma palavra para "verde" mas sim, seis palavras diferentes para seis tons de verde diferentes. De certo modo, encontramo-nos no momento em que descobrimos que entre essas "seis" palavras diferentes há suficientes atributos semelhantes para "descobrirmos" uma única palavra.


3º - Descrever. Tendo destacado algo passível de ser designado posso descrevê-lo. De certo modo, descrever implica regressar às razões que provocaram o destaque e a designação. Ao descrever percorro os limites do destaque para entrar na justificação da designação. A descrição aceita o destaque como limite do seu desenvolvimento. Descrevemos aquilo que foi destacado precedido da sua designação. No entanto, a descrição exige mais. Exige uma formulação de atributos internos que, ainda que provisoriamente, possam justificar tanto o destaque como a designação. Partindo do destaque, a descrição trata daquilo que é interno ou intrínseco ao destacado/designado. Por outro lado, a descrição de algo designado comporta sempre as limitações do conhecimento sobre aquilo que foi destacado. A descrição de "Noruega" é praticamente infindável, no entanto posso descrever Noruega como um país, europeu, escandinavo cuja capital é Oslo caracterizado pelos seus fiordes cujo regime é monárquico, etc., etc. Quer isto dizer que entre esta descrição sucinta e o mapa do imperador de Borges, que, desenrolado, cobria exactamente todo o império, há uma multiplicidade infinita de descrições mas que todas dependem do destaque e da possibilidade de designação.
Descrever o Design, que, como vimos, designa quase tudo, parece ser tarefa impossível.
Descrever pode ter sido tarefa do Desenho, mas foi, sobretudo tarefa da Literatura.
Recorro a Italo Calvino e à "Trilogia dos Nossos Antepassados". Escrita nos anos cinquenta do séc. XX, esta trilogia é constituída pelos livros: "O Cavaleiro Inexistente", "O Barão Trepador" e "O Visconde Cortado ao Meio".

Descrever I - O Cavaleiro Inexistente - Próteses e Extensões

O Cavaleiro inexistente é apenas constituído pela sua armadura. Externamente aparenta ser humano mas é apenas a sua "pele" defensiva. Ele simboliza todas as próteses e extensões do humano. Na armadura do cavaleiro estão simbolizados todos os objectos que em contacto ou não com o corpo prolongam as suas capacidades. Esta é uma descrição de Design que evoca o seu primeiro destino associado à segunda revolução industrial sob o império da produção em série e de massa. O cavaleiro inexistente é o Ford T ou o Fiat 600 alinhados na cadeia de montagem, vazios, mas já humanos. (não posso deixar de sentir prazer quando as escovas da lavagem automática percorrem o dorso da minha Peugeot 505 e até um certo arrepio quando passam pelas cicatrizes dos erros de estacionamento).
O Design construiu um Homem contemporâneo inexistente sem a sua armadura de extensões. Só a armadura o mantém vivo e consequentemente humano.
Os santos e os deuses eram reconhecíveis pelos seus atributos. Na mitologia greco-latina e no conjunto dos santos apostólicos romanos nenhum é, por si só. Um objecto, uma pose, uma indumentária, uma acção culminante são determinantes para a sua representação. A função comunicativa dos objectos que possuímos têm o mesmo valor. Não esqueçamos que as representações dos deuses são realizadas por humanos. Basta pensarmos nos quatro evangelistas, sempre acompanhados dos seus entes de estimação. Não se pretende, consequentemente justificar a construção da armadura do homem contemporâneo com um desejo de divinização, mas sim um desejo de atingir os atributos dos deuses criados pelos homens para os reconhecer.
Gregor Samsa, transformado numa enorme barata torna eloquente o cavaleiro inexistente. Intimamente, ainda ele, Gregor Samsa não tem acesso à sua armadura. O conjunto dos objectos e dos espaços que constituíam a sua armadura são-lhe inacessíveis, mais valia que se tivesse tornado incorpóreo como o herói de Calvino. A história de Samsa ilustra quão ajustados ao nosso corpo estão os objectos, quão apertado é o “fato” que julgamos múltiplo e espaçoso.
Em Vitruvio encontramos uma possível origem para a história do cavaleiro inexistente e para a incomodidade de Gregor. O conceito de Decor constituinte da categoria Venustas, parte da tríade arquitectónica, postulava que a forma se deveria adequar à função comunicativa do edifício. Este conceito dá origem a duas palavras em português Decoro e Decoração. Ambas as palavras, no seu uso corrente desvirtuaram a sua origem. No entanto, julgo que o paradigma central do Design industrial ou de Produto é o Decoro. É este decoro que reforça a estreiteza do fato. Os objectos ajustam-se, não só ao corpo, mas sobretudo, ao que pretendemos comunicar. As cavalgadas do marketing e dos targets transportam o cavaleiro inexistente para toda a parte.
A múltipla produção de objectos permite que cada um construa a sua armadura, tornando-se cada vez mais invisível substituído pelo sistema de objectos que a si associa.
O cavaleiro inexistente simboliza, também, a vaca e o burrinho do presépio do Design: A Ergonomia e a Antropometria. Não é por acaso que a primeira se desenvolve na Guerra e a segunda na criminologia. Poucas actividades humanas esvaziam tanto o humano da sua individualidade. A armadura animada de Calvino é correctamente proporcionada e medida e as articulações permitem-lhe um desempenho ergonómico perfeito. Assim o fazem o Homem Invisível de H.G. Wells, Michael Jackson e Stephen Hawkins que são, afinal, a mesma pessoa e exemplares extremos do que pretendemos descrever.

Descrever II - O Barão Trepador - Cibermundo

O jovem barão decide, aos doze anos, passar a viver nas árvores e nunca mais por o pé em terra. Assim se passa a sua existência, sempre em contacto com o mundo dos restantes humanos, mas onde os caminhos são mais curtos. Ele é ao mesmo tempo mensageiro e profeta. Na floresta, que cobre grande parte da Europa ele desloca-se na multiplicidade dos ramos onde é sempre possível encontrar uma ligação.
Para o Designer o mundo é visto como um incomensurável conjunto de feixes de comunicação. À primeira vista este facto pode parecer resultar da generalização da world wide web. Na verdade, o universo www nasceu com o telégrafo e desenvolveu-se com a televisão. A www não passa de um telégrafo televisível ou de uma televisão telegráfica.
A produção de objectos de comunicação e a atribuição de valor comunicacional a objectos é que criou a possibilidade da web. O telégrafo permitiu a globalização de capitais e mercados. A televisão permitiu a consolidação do Marketing e da Publicidade.
A web não é mais do que a cristalização daquilo que já existia: um fluxo constante de significados no seio do mundo artificial. O Design recria continuamente esses feixes de significados. O projecto conta com eles como parte essencial da sua estratégia. A representação de algo a produzir é, fundamentalmente, a criação de um feixe de significados. O designer opera, assim, num mundo abstracto de ligações comunicacionais que se realizam nos mais insuspeitos sistemas de objectos.
A Design, associamos normalmente, a ideia de Inovação. Esta não passa da reconfiguração de sistemas. Ao encontrar um caminho por entre a míriade das ligações possíveis que os ramos das árvores oferecem (um caminho mais curto que os terrestres) o Barão Trepador, opera num nível diferente do sistema de objectos vigente a que podemos chamar, genericamente, Tradição. Os seus contactos com o mundo não-projectual são pontuais, interferindo e modificando a Tradição, criando tradições provisórias através dos indícios do seu verdadeiro movimento. Quando se recolhe para as árvores, para o projecto, a visão que retém do mundo embaixo é fragmentada, resultante daquilo que é apenas visível por entre os ramos.
Entretanto, o vestígio do resultado da sua aparição, a nova tradição provisória, ganha autonomia e movimenta-se lentamente pelos caminhos da terra. A relação entre o Barão Trepador e os seus conterrâneos é, assim, sempre carregada de surpresas, de novas perplexidades. Embora haja sempre um preço a pagar pelas surpresas o Design encontrou o plano onde operar.
O Designer decidiu nunca mais pôr o pé na terra porque não é deste mundo. É do mundo que há – de vir.

Descrever III – O Visconde Cortado ao Meio – Arte e Ciência

O visconde, atingido por um tiro de canhão vê-se dividido em duas partes. Esta catastrófica fractura separa-o na metade boa e na metade má. A metade má exerce a sua crueldade no governo do seu senhorio provocando a miséria e o terror dos seus súbditos. A metade boa surge depois. A sua bondade provoca também toda a sorte de acidentes e desgraças. Finalmente, por amor de uma donzela, defrontam-se em duelo. Feridos de morte, são salvos por um cirurgião inglês que os consegue recoser.
O Visconde é o Homem da Idade Moderna, inteiro como projecto, na Renascença, que, neste caso, a pouco e pouco se vai separando em Arte e Ciência. O Desenho tinha criado essa bela ilusão de que um homem completo e íntegro dominaria todos os aspectos do seu devir. Os desastres de Leonardo com a sua máquina voadora indiciavam já que ao segredo do voo das aves não se chegava através do Desenho. Por mais que conhecesse pelo desenho o maquinismo de funcionamento da asa, a diferença de pressão entre a face superior e a face inferior (razão da sustentação) não era visível e, consequentemente indesenhável.
Mais tarde, a acção conjugada de Lavoisier e Dalton conseguiu reunir a Química, a Matemática e a Física criando um mundo onde o Desenho não podia chegar. No início da Idade Contemporânea, a reacção da Arte surgiu com o Romantismo que desferiu a machadada final separando as duas metades. O artista romântico fechou o seu campo à ciência franzindo o sobrolho às explicações.
O início da reunião deu-se através de uma visão do mundo natural que se tornou cultural: a teoria da evolução das espécies. A natureza que tinha sido o referente da harmonia e estabilidade formal passava a significar mutabilidade, transformação, morte e extinção, adaptabilidade. No final do século XIX o evolucionismo tinha já penetrado profundamente na cultura da sociedade da esfera protestante. Em certa medida, reforçava os aspectos do livre arbítrio. Embora arte e ciência não se tivessem recosido, os primeiros passos foram dados. A Bauhaus resulta de duas interpretações da teoria evolucionista. A de Alois Riegl, com a sua Kunstvollen (vontade da arte) e Max Nordau com o seu Enfartung (degeneração) criaram condições para que a Bauhaus surgisse como adopção da primeira e reacção à segunda. Esta reacção comportava sobrelevar os aspectos éticos da produção que através da técnica e da ciência se deviam auto justificar na forma.
Apesar deste início cada uma das metades seguiu o seu caminho durante o séc. XX, fazendo maldades e bondades mas sempre incompleta, fazendo os súbditos sonhar com a plenitude dos desejos de prosperidade e paz que o jovem visconde inteiro tinha augurado.
É sedutor pensar que o cirurgião inglês se chama Design. Parece ser o único capaz de saber tanto da anatomia de uma metade como da outra.
Nesta evocação não se pode decidir que é o mau e quem é o bom. Na história de Calvino, o Visconde volta a ser uno e completo embora enriquecido pela experiência do seu tempo de ser dividido.

4º - Definir

Se o cirurgião é o Design, se o mau e o bom são a ciência e a arte, resta saber quem é a donzela que catalisa a união e, também, quem é o sobrinho narrador.
O sobrinho é a História, a contínua possibilidade de construir uma linha temporal através da narrativa.
A donzela é o deleite e a possibilidade de perpetuação. É o indefinível presente em cada acção humana. É a possibilidade de uma relação amorosa com o mundo que está para além daquilo que seria plausível pensar. É a Venustas vitruviana, a genitrix, o agente catalisador nas novas formas que buscam o tão indesmentível como inexplicável deleite na reprodução sexuada em que os opostos se misturam. Gerar o novo, ainda que participado pelo antigo, é, ainda, a condição essencial para definir Design.

Em Conclusão, para podermos definir o Design poderemos dizer, então e agora que:

O Design é o cirurgião inglês, que, na voz da História, cose pedaços do Homem para que este se possa perpetuar… até nova separação.


Eduardo Côrte-Real, arquitecto, Professor associado da Escola Superior de Design do Iade

O Reactor agradece a Eduardo Côrte-Real e à Arte Capital Arte Capital a publicação do presente ensaio.

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