Sunday, November 01, 2009

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EXD’09, QUE BALANÇO?


No próximo fim de semana encerra a edição 2009 da Experimentadesign. Quase dois meses depois do início podemos procurar fazer o seu balanço.


Quem teve oportunidade de assistir à semana inaugural, para além da agitação das inaugurações (e é também agradável sentir como o design pode agitar o quotidiano) e da (re)descoberta de vários locais espantosos da cidade (do Mercado de Santa Clara ao palácio Braancamp), no que já é uma das imagens de marca da Bienal, confrontou-se ainda com inúmeras propostas e reflexões estimulantes sobre o design contemporâneo. As Open Talks e as Conferências de Lisboa reflectem méritos e desequilíbrios que resultam da estratégia de programação: a de abarcar grande parte do vasto campo da actual cultura do projecto. O que implica um grande esforço de “representatividade” a nível disciplinar, geográfico, ideológico e estratégico. A consequência é de que dificilmente todas as intervenções (ou sequer a maioria) nos poderá interessar, independentemente da força da maioria dos participantes. No entanto, à excepção da duvidosa Open Talk 1 a restante programação foi, sem dúvida, estimulante.

Para ver, com tranquilidade, as exposições o ideal seria aguardar pelas semanas seguintes. Para a mais ambiciosa das exposições desta edição, a Experimenta convidou a conceituada curadora britânica Emily King e o resultado é, sem dúvida, muito interessante. O desafio de Quick, Quick, Slow, realce-se, era grande, mas dela resultou uma aproximação segura à história da imagem contemporânea a partir do olhar de um designer gráfico cuja linguagem vai sendo sucessivamente influenciada por diferentes objectos, suportes e meios, da animação aos videojogos.

As restantes três exposições, de características (e orçamentos) diferentes, cumprem os seus propósitos. Eventualmente, poder-se-ia esperar mais da Timeless que envolvendo um ponto de partida interessante e tendo reunido um conjunto sedutor de participantes nacionais e internacionais (Public Works, Abake...) resultou numa exposição algo difusa e desequilibrada.

Em relação aos catálogos da exposições nenhum é particularmente estimulante. O mais ambicionado, o da Quick, Quick, Slow é mesmo fraquinho. O mais interessante talvez seja o da Lapse In Time que é também o que mais me agrada graficamente. Um bom exemplo de como se poderia fazer mais com menos surge nas poucas páginas do interessante Portugal Imaginado criado por Joana Baptista Costa e Mariana Leão.


O ciclo de Cinema Contar o Tempo, programado por Ricardo Matos Cabo, apresentou na Cinemateca uma selecção de filmes maioritariamente dos anos 60 e 70 ligados ao Cinema Directo que, curiosamente, não terão menos como tema central o “espaço” do que o “tempo”. Claro que o tempo é central em muitos deles (essencialmente o tempo das imagens e as suas formas de narração) mas é a questão do espaço (seja na aproximação entre Cinema e Land Art no filme de Robert Smithson ou de Michael Snow; seja na centralidade narrativa da paisagem no conto de Ogawa; ou na exploração “topológica” do cinema directo de Jean-Claude Rousseau) aquela que naqueles filmes era mais determinante. O ciclo, apesar dos seus méritos, pareceu-nos descontextualizado da Bienal, para mais sabendo-se como a programação de filmes sobre design é, entre nós, tão escassa.

Uma palavra também para os inúmeros Tangenciais (apesar de nem todos os anunciados terem inaugurado) que garantiram um interessante efeito de contaminação da EXD pela cidade com alguns óptimos resultados (como o tangencial dos R2).



Ao nível dos conteúdos electrónicos, esta edição apresentou duas novidades: a existência de um blogue e a disponibilização de alguns textos em .Pdf a partir do site principal. A ideia de proporcionar “leituras complementares” (interessante o texto de Max Bruinsma) merece sem dúvida ser melhor explorada depois desta (tímida) experiência. Também o blogue carece de um outro tipo de gestão que garanta conteúdos mais ricos, mais informação, estimulando o debate a partir do blogue que, desta vez, foi inexistente.


São conhecidos os “anti-corpos” que a Experimentadesign gerou ao longo destes anos. Algumas críticas lançadas à EXD parecem-me espelhar essa “reacção epidérmica” seja ao formato da Bienal, seja à equipa da Experimenta, seja ao seu inquestionável sucesso. Neste sentido, algumas criticas parecem-me pouco consistentes, dois exemplos:

1. A crítica de que a EXD não contribui para a “descentralização” do design em Portugal. Talvez seja verdade, mas a EXD é, legitimamente uma Bienal de Lisboa (tal como a Luzboa o é ou tal como o London Design Festival é, legitimamente, um evento de Londres). Podemos sempre discutir as vantagens em concentrar ou dispersar, mas essa discussão não retira legitimidade à opção da Experimenta.
2. A crítica de a EXD é um acontecimento de forte componente “cosmética”, canalizando parte do orçamento para a promoção do evento e sua vertente lúdica. Também aqui, poderá haver alguma verdade mas, de novo, trata-se de uma opção legítima e, seguramente, estrategicamente justificada em função das linhas de gestão da Bienal (angariação de patrocínios e públicos, projecção internacional, auto-gestão de projectos tangenciais etc.). Claro que podemos discutir o formato, tal como podemos discutir o formato da Bienal de Saint-Étienne ou da Utrech Manifest mas isso não anula a legitimidade do formato escolhido e o sucesso da sua concretização.


Em síntese, neste regresso a Lisboa a edição 09 da EXD confirmou a importância que a Bienal tem no contexto do design português e o efeito catalisador que sempre acaba por gerar. Apesar da inclusão de novos curadores e programadores, a programação principal mantém uma identidade que facilmente associamos a Guta Moura Guedes. Esse mérito é seu. Com uma maior estabilidade política que se espera haja na Câmara Municipal de Lisboa e a manutenção dos principais patrocinadores, poder-se-á esperar uma edição 11 porventura ainda mais sólida. Vários detalhes poderão contribuir para essa solidez: uma programação mais distribuída pelo tempo da bienal evitando o efeito de esvaziamento de balão que se sente após a semana inaugural; uma maior capacidade de explorar o espaço público, tornando o evento mais contaminador da cidade; uma maior aposta na história do design português de que a edição 09 teve algumas aproximações; a exploração do blogue como espaço de discussão, criação e teorização; a publicação de um catálogo geral de não apenas documente mas produza conhecimento sobre design.

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REACTOR é um blogue sobre cultura do design de José Bártolo (CV). Facebook. e-mail: reactor.blog@gmail.com