Sunday, September 09, 2007

HETERODOXIAS (de um design blogger)




A questão surgiu-me assim: “Porquê designers em tempo de aflição?”. Já falámos sobre isto antes, não se trata de encontrar a solução mas, antes, de enunciar o problema. Em design, trata-se sempre de jogar com o invisível, de procurar figurar o que insiste em se esconder e permanecer entre nós “não dito” e importa saber que nunca ficará definitivamente dito. Dizias-me que “fazer design” é trabalhar nas margens (tecer as margens), composição a partir de elementos residuais – residual em todos os sentidos.

Defina-se o contexto da nossa conversa: noite quente (“que Setembro este”, comentávamos); bebemos chá de menta frio e tu fumas-te, de seguida, vários cigarros indianos.

Não há pura abstracção, mesmo quando se procura concretiza-la, este é um bom exemplo. Quando te dizia que o trabalho do Christopher David Ryan tende para uma crescente abstracção, não estava apenas a referir-me a ausência de uma preocupação figurativa mas como essa ausência torna presente uma linguagem gráfica que concretiza uma espécie de exercício de montagem de referências (vindas da pintura, da tipografia, do design gráfico dos anos 70) que inclui o próprio título do trabalho.

Christopher David Ryan | The Solar System

Christopher David Ryan | You Don't Listen


Não te respondi à tua primeira questão – sobre o design numérico – mas espero ter sido claro na resposta à segunda: parece-me evidente que o facto de um trabalho usar uma comunicação (e uma estratégia comunicativa) mais directa, não o torna, por esse facto, nem mais nem menos politico.

Joana Baptista Costa & Mariana Leão | Manifesto Contra!

Há um trabalho de citação em todo o design gráfico que hoje é feito. Porque te dizia eu, então, que isso não lhe retira originalidade? Porque a autêntica originalidade tem sempre a ver com um exercício de repetição: fazer de novo. Há aquela ideia do Harold Bloom sobre a “ansiedade da influência”: a lei da criação coincide com a da circulação e da metamorfose. O exemplo do trabalho de Street Value está longe de ser o melhor mas confirma as ideias que introduzi no post sobre o design gráfico norte-americano.

StreetValue

“A linguagem tem em si mesma o seu princípio interior de proliferação” defendia Foucault. O original nunca é imóvel. O que se chama “original” não chega a ter existência própria enquanto tal; o que há são sistemas de virtualidades de sentido, que requerem mediação, leitura, comentário, tradução. Também em design não há “arquitexto” mas, fundamentalmente “pré-texto”.

Matthew Wahl | Don't Believe the Type

Vivemos num mundo onde a análise tende a ser substituída pelo “slogan”. Não admira que mesmo comentários que se pretendem “sérios” possam terminar numa colecção de disparates. Mas em relação aos conselhos para os professores de design do Chochinov no Core77 (é nisso que penso) vou-me ocupar num outro post.

As reflexões orwellianas voltaram. Ainda bem.




Aqui estamos de acordo (ambos gostamos do trabalho da Nakakobooks). Aqui também estamos de acordo: a recente entrevista do Wim Crouwel fornece-nos um olhar privilegiado sobre a história recente do design gráfico.




Não se pode falar de uma língua senão noutra língua. Continuamos noutra altura.

No comments:

ARQUIVO

PERFIL

REACTOR é um blogue sobre cultura do design de José Bártolo (CV). Facebook. e-mail: reactor.blog@gmail.com