Monday, November 24, 2008

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NOT YET!

Não há projecto em Design sem o envolvimento do que, Gore Vidal, chamava de spirit of yet. Ser-se designer pressupõe acreditar num tempo futuro, que não sendo presente, yet, pode encontrar condições de realização através do processo projectual. Gui Bonsiepe dizia, a propósito, que “o futuro é o tempo onde se desenvolve o projecto de design, sendo através do design que esse futuro se concretiza”.

A este “spirit of yet”, a que também podemos chamar de “utopia” ou de “esperança projectual” (conceito trabalhado por Tomás Maldonado na sua obra maior: La Speranza progettuale de 1970) dedicou Max Bruinsma o seu mais consistente ensaio: The ideal design is not yet .

Partindo do conceito de utopia trabalhado por Ernst Bloch – "The perfect world as yet to come" – Bruinsma afirma que “In design, this notion of not yet has now regained its relevance. On the one hand it is relevant as an idea of practical idealism, in which the actual process of communication is at least as important as the fixed end result.”.

A relevância do processo em Design, igualmente discutida por Bruinsma em conversa com Bruce Mau , a relevância da “obra aberta”, como lhe chamava Umberto Eco, ou do design open-ended, são ideias referidas dentro de uma argumentação que valoriza crescentemente a recepção e que sugere um novo protagonismo ao designer dentro do que o próprio Umberto Eco chamava de recepção activa:"By accepting the possibility of leaving a design open-ended, by up to a point not finishing it, the designer not only leaves room for the recipient’s and reader’s own interpretation of the message - an emancipatory aspect, this - he also creates the space for a personal standpoint. The design now suggests that this is how things might be - it opens a dialogue about the way it itself functions in the communication process of which it is a part.".

Ao lermos o texto de Bruinsma reconhecemos a actualidade do velho texto de Umberto Eco intitulado Guerrilha Semiológica, datado de 1967.

Umberto Eco fazia coincidir o exercício de guerrilha semiológica com a possibilidade ética da comunicação no actual contexto de sociedades de comunicação de massa. Afirmando:

“O fenómeno das comunicações de massa pressupõe que existe um instrumento extremamente potente que nenhum de nós jamais conseguirá regular: existem meios de comunicação que não são controláveis por nós. (...)
Por isso à solução de estratégia será necessário aplicar uma solução de guerrilha.(...)
Se querem uma formulação menos paradoxal direi: a batalha pela sobrevivência do homem como ser responsável na Era da Comunicação não se vence lá de onde a comunicação parte mas lá onde chega. (...)
O universo da comunicação tecnológica seria atravessado então por guerrilheiros da comunicação que reintroduziriam uma dimensão crítica na recepção passiva.”.

Iniciativas como o Bubble Project ou The Decapitator podem ilustrar as possibilidades dessa recepção activa capaz de reintroduzir, localmente, um novo sentido a uma mensagem global. Nas últimas eleições para a Câmara Municipal de Lisboa, vários muppis de propaganda foram intervencionados, junto à boca de cada candidato saia um balão vazio. Aquele elemento significante caricaturava imediatamente o candidato a presidente, ao mesmo tempo que sugeria a equalização e pobreza dos vários discursos políticos.

No interior de um sistema de comunicação em massa, o individuo podia reinvindicar a sua autonomia, o seu protagonismo, através da forma como, operando a passagem de receptor a emissor, se envolvia activamente num processo de comunicação que apenas circunstancialmente pode afectar. Mas nessa afectação, por circunstancial que seja, residia um sinal de esperança, aquele individuo ainda assumia a sua cidadania, ainda reivindicava a sua individualidade, não se encontrava vencido pelo sistema, not yet.

Nos últimos tempos, gradualmente, assistimos ao modo como grandes empresas recorrem a estratégias de guerrilha – o chamado marketing de guerrilha – para sua promoção. Recentemente, o Centro Comercial Mar Shopping envolveu largamente este tipo de soluções comunicacionais na sua estratégia de divulgação – adolescentes a pedirem boleia para o Shopping ou a deslocarem-se para lá, de Metro, em fato de banho e munidos de prancha de surf. Talvez se possa falar aqui de uma espécie de “terrorismo de estado” que visa reforçar o controlo sob o espaço mediático.

A questão é esta: há uma inevitabilidade no design se desenvolver no interior do espaço mediático, espaço esse cujo controlo parece irremediavelmente perdido por parte do designer. Esta “perda” sente-se de múltiplas maneiras, desde logo na forma como os designers vão perdendo a crença no design. Termos como “utopia”, “ética”, “esperança projectual”, “the spirit of yet” são termos que podem ser envolvidos ou apregoados no plano dos discursos mas tendem, cada vez mais, a estar ausentes, no plano das acções.

Bruno Zevi falava de uma “crise de uma disciplina decaída em profissão: o design.” (L’Expresso, 24 de Julho de 1968). Afinal é importante não nos esquecermos: o design não é aquilo que os seus profissionais dele fizerem. A ética disciplinar não se aliena na ética individual ou corporativa. O design ideal é sempre “not yet”.

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REACTOR é um blogue sobre cultura do design de José Bártolo (CV). Facebook. e-mail: reactor.blog@gmail.com