Saturday, September 05, 2009




Primeiro foi um crítica francesa a expressar a sua desconfiança em relação ao design francês, logo de seguida uma crítica inglesa seguiu-lhe os passos desconfiando do design britânico e agora foi a vez de um crítico português, coerente com uma análise que vem desenvolvendo há anos, identificar uma certa mediocridade do design nacional. Qualquer dos três textos, escritores por autores relevantes como são Véronique Vienne, Alice Rawsthorn e Mário Moura, suscitaram viva reacção. Curiosamente, as reacções mais indignadas em relação a uma pretensa pobreza do design nacional não surgiram de britânicos arrogantes da sua história ou de franceses incomodados com uma descrição algo caricatural de Vienne, mas antes de leitores portugueses que, perante a crítica de Mário Moura, se apressaram a agitar glórias de prémios internacionais e afins.

Perante a evidência da análise de Mário Moura as reacções surpreendem. O que está em causa não é a inexistência em Portugal de designers, críticos ou curadores de qualidade. O que está em causa é a evidência de que os nomes que possamos evocar em defesa dessa qualidade – R2, Mário Moura, Andrew Howard – serem nomes excepcionais (por isso os evocamos consensualmente).

É absolutamente enganador procurar fazer crer que os R2 representam o trabalho de um atelier de design em Portugal quando a realidade é a de um número crescente de designers desempregados, mal empregados e inapropriados; é absolutamente enganador fazer crer que Mário Moura representa o interesse de um licenciado em design ou de um professor de design pela leitura, reflexão e escrita sobre design, quando a realidade é a de uma crescente ignorância e desinteresse relativamente ao esforço de pensar o design; por fim, é enganador fazer crer que Andrew Howard representa os curadores de design em Portugal, quando a realidade é a de um país sem espaços de exposição e pobre em eventos e publicações de design.

Por último, realce-se que a desconfiança da crítica, sendo desejável, só é activa se suscitar em nós a autocrítica. Era esse, enfim, o lamento de Mário Moura, a inexistência de uma autocrítica séria nas nossas escolas, nas nossas empresas, na maioria de nós. E é aqui, precisamente, que reside a questão fulcral, uma verdadeira cultura de design nacional não reside na efemeridade de um projecto, prémio ou evento (como se fosse possível possuirmos uma cultura de design dinâmica em intervalos de dois anos por ocasião da Experimentadesign), reside na consistência da sua autocrítica e no que, a partir dela, se é capaz de gerar.

5 comments:

joao said...

Onde se lê: "mas antes de leitores portugueses que, perante a crítica de Mário Moura, se apressaram a agitar glórias de prémios internacionais e afins."

Deve ler-se: "mas antes de um número crescente de designers desempregados, mal empregados e inapropriados que, perante a crítica de Mário Moura, se apressaram a desfazer um pessimismo ainda mais desmotivante afirmando que também existe bom design em Portugal"

É absolutamente enganador fazer crer que estes "leitores", são mais inapropriados que os que se empregam bem, e que fazem coisas que se integram com facilidade, que são mais desajustados que britânicos arrogantes da sua história ou que franceses incomodados.

Esta agitação é saudável. É sinal que não o design português existe e que não está morto... Não percebo muito sinceramente porque se aflige com isso.

Era o que faltava! Não podemos discordar por exemplo desta dura generalização: "Um designer português mais ambicioso, que queira ganhar mais dinheiro, resume-se a alguém cuja maior ambição é gerir o filho bastardo de uma agência publicitária com uma agência de secretariado."

Pessoalmente concordo com o cerne da mensagem que o Mário passou no texto. E não é essa! Mas consigo deixar passar a ideia de que o design português não existe. Existe um novo design português. Um que já não é direitinho, apropriado, suiço. Tenham a bondade de olhar em volta, talvez para a maioria dos desempregados, antes de proclamar a mediocridade total.


E a crítica?? Respeito-vos muito, respeito a vossa opinião e admiro a vossa lucidez, mas acredito que não gostaríeis de encontrar crítica sobre a crítica portuguesa afirmado que sois desajustados, que o vosso trabalho é mau, muito mau, que isso é visível na crescente ignorância e desinteresse relativamente ao esforço de pensar o design. Isso sim seria enganador...

É num momento de pessimismo unânime dos únicos dois críticos de design que leio todos os dias que levanto o polegar. Algum design português é bom.

Valoriza-te para mais: os outros ocupar-se-ão em baixar o preço.
Fonte: "Apontamentos"
Autor: Tchekhov , Anton

REACTOR said...

Não me sinto em desacordo consigo. Também a mim me parece muito saudável a reacção que o post do Mário mereceu. A reacção não me aflige, pelo contrário, é quando a reacção surge que eu começo a ficar mais optimista!
E claro, para que não fiquem dúvidas, também eu subscrevo que algum design português é muito bom.

REACTOR said...

Já agora, para se comprovar como há muito bom design português, fica o convite para exposição por mim comissariada "O que é urgente mostrar" que inaugura dia 09 no lounging space da experimentadesign com a participação de Aurelindo Jaime Ceia; Barbara Says; Braço de Ferro; Diogo Vilar; Drop/João Faria; Martino/Jaña; Mário Moura; Paulo T. Silva; R2.

joao said...

Ainda há bem pouco tempo escrevi um post curto onde disse que a Experimenta não é para mim. Agora talvez compre um bilhete de comboio para a ir visitar nesse dia.

http://eurosom.blogspot.com/2009/08/experimenta-design-de-equipamenta-e.html#comments

Pedro said...

Achei muito interessante o texto do Mário Moura, assim como algumas posições tomadas pelo mesmo, posteriormente nos comentários.

Acho no entanto que a discussão acabou por desviar-se de alguns pontos chave expressos no texto original, como a estratégia de financiamento e investimento na educação, ou o ascender do sistema de créditos e consequente mercantilizaçao da educação.

A discussão acabou por centrar-se demasiado em definir a qualidade do Design Português, sem no entanto estabelecer um ponto de comparação sólido: é bom ou mau em relação a quê?

Dao-se exemplos vindos de Inglaterra, Holanda, e por vezes esquece-se a comparação com Espanha, o único país Europeu com um trajecto histórico paralelo ao nosso, quer pela proximidade, quer pelo período de ditadura, de analfabetismo, quer pela ausência na segunda guerra mundial. Além de que começou ligeiramente mais cedo que nós a ensinar Design de forma oficial.

Por vezes olhamos demasiado longe e sentimos frustração na comparação com países que, como disse o Mário, levam 150 anos de avanço no investimento na educação. Observar a forma dos Espanhóis resolveram ou lidaram com as mesmas questões pode ajudar-nos a resolver os nossos problemas, vendo de perto as opções tomadas por outro país, que passa quase simultaneamente (ainda que com um ligeiro avanço) pelos mesmos problemas.

Como profissional, encontro que a única maneira de nao ter amarras e poder ter uma atitude crítica e de curiosidade, é exercer de forma autónoma, sendo que tal exige capacidades que vao além do que considero necessário para constituir um bom designer. Concordo que o título de Sr. Professor pode muito bem ajudar a neutralizar essas faltas de capacidade.

Considero que o estagiário será sempre uma figura presente no nosso vocabulário, e se existe atraso no design Português, vejo esse atraso ligado à escassa qualidade e quantidade de iniciativa empresarial do nosso país.

Mas é claro e como já alguém disse, a excepção quase sempre confirma a regra, em Portugal temos boas excepções, e aí estamos ao nível dos melhores.

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REACTOR é um blogue sobre cultura do design de José Bártolo (CV). Facebook. e-mail: reactor.blog@gmail.com